O presente blog tem por finalidade a divulgação das produções acadêmicas da disciplina de Suportes Cênicos do curso de Licenciatura em Teatro da Universidade Aberta do Brasil/Universidade de Brasília realizadas na segunda etapa da disciplina no 2º semestre de 2010, servindo como um diário de bordo e local específico para veiculação das atividades e trabalhos.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

APRESENTAÇÃO
            A Commedia dell’Arte, gênero teatral que encontrou o seu auge nos séculos XVI ao XVIII, originou-se na Itália quase no final da Idade Média, e por ser um gênero teatral com aspectos profissionais, com forte característica de tradição familiar, e por valorizar na sua estética um rigoroso trabalho corporal, da máscara e do improviso tornou-se referência para vários teatrólogos modernos, e mesmo não existindo mais nos moldes tradicionais não é difícil encontrar nas produções contemporâneas referências da sua estética.
            Dentro da concepção corporal apoiada no homem do medievo as máscaras dell’arte carregavam importantes significações e finalidades, entre elas, a de provocar a imediata identificação dos personagens pelo público; a de possibilitar que atores distintos representassem o mesmo personagem e a de representar os tipos não pertencentes à nobreza. 
            Segundo o teatrólogo Dario Fo[i], as máscaras da Commedia dell’Arte são zoomórficas, aludindo especialmente aos animais de quintal e domesticados. Sendo que estas características animalescas estão presentes no Arlecchin (macaco e gato), no Capitano (mastim e perdigueiro), no Pantalone (peru e galo), no Brighella (metade cão e metade gato e Dottore (porco). Outro aspecto da máscara é a polissemia: “concebida para adotar todas as expressões possíveis, ficando o ator encarregado de dominar a arte da representação com máscara”. (VIEIRA, p. 58) [ii]
            Dentre as principais máscaras podemos citar o Pantaleone, Policchinella, Doutore e Arlequino, sendo, no geral, os personagens da Commedia dell’Arte divididos em três categorias: os zanni de classe social mais baixa (servos); os vecchi que representam os de classe social mais abastada e os enamorados:
            Pantaleone era um personagem altivo que satirizava a burguesia da época, a sua máscara (nariz longo, fálico e curvo, olhos pequenos) e o seu vestuário possuíam características definidas de tipos da sociedade italiana, fosse através da indumentária, fosse pelos gestos e impostação da fala ao representar o dialeto de certa localidade. Policchinella era o mais baixo na escala social dos zannis, era o mais deficiente, o mais estúpido e o mais faminto criado, seus movimentos eram exagerados e sua cabeça parecia não acompanhar os movimentos do seu corpo. Já o Doutore era visto como o homem intelectual, sendo o mais velho e rico dos vecchi, geralmente interpretado como um pedante, avarento e sem o menor sucesso com as mulheres; usa uma toga preta com gola branca, capuz preto apertado sob um chapéu preto com as abas largas viradas para cima.[iii] Enquanto Arlequino era um palhaço, acrobata, amoral e glutão, facilmente reconhecível pela roupa branca e preta com estampa em forma de diamantes; sua máscara possui uma testa baixa com uma verruga, algumas vezes usa um lenço negro sob o queixo e amarrado no alto da cabeça[iv]. Os enamorados e as enamoradas eram jovens amantes, virtuosos e perdidamente apaixonados um pelo outro; eles usam os trajes mais belos e de acordo com o período e a moda vigente e nunca usam máscara.       
O Grupo Teatral Moitará[v], referência nacional sobre o estudo de máscaras de teatro, investiga e trabalha sobre várias formas de máscaras: a neutra, de fisionomia simples e simétrica, sem conflitos; a abstrata, máscara inteira de forma geométrica, sem menção animal ou humana; a larvária, um rosto inacabado, com formas simplificadas da figura humana, remete ao primeiro estado dos insetos; a expressiva tem feições mais elaboradas com definições de caráter que traduzem estados de ânimo; a meia-máscara é falante e cobre somente a parte superior do rosto. Geralmente representam "tipos-fixos”; acento é a que acentua uma parte isolada do rosto, como o nariz e/ou testa e, por fim, o grupo pesquisa ainda máscaras representativas dos tipos populares brasileiros, na qual os atores e atrizes buscam a fisicalidade e a vocalidade sugeridas pelas máscaras, embutindo no processo de estudo as características típicas e o contexto histórico e cultural desses “personagens-tipos”.

JUSTIFICATIVA
            O uso de máscaras para a composição dos personagens do “Tabarim: guarda de honra” partiu do processo de pesquisa iniciado com a leitura e reflexão sobre o texto, no qual discutimos que a estrutura da farsa assemelha-se aos textos cômicos da Commedia Dell’arte, sendo a utilização das máscaras condizente entre as variantes estéticas possíveis para montagem desse espetáculo.
            Então partimos para o estudo de uma das principais características da máscara dell’arte: o hibridismo entre as características humanas com as de animais - máscara zoomórfica. Nessa etapa os participantes escolheram um animal que representasse as características tanto físicas quanto comportamentais de um dos personagens para servir de inspiração e de modelo para a construção da máscara.
            O texto apresenta três tipos de personagens farsescos da Commedia Dell’arte: velhos, enamorada e zanni. Os velhos representados pelos personagens Lucas Joufflu (pai de Isabela) e pelo Capitão Rodomonte; o zanni representado por Tabarin (o criado) e a enamorada representada por Isabela, no qual Tabarim representa o primeiro zanni, provavelmente o Arlecchino; Lucas seria Pantalone (rico mercador, avarento e conservador); Rodomonte seria o Capitano (covarde que contava vantagens das suas proezas) e Isabela seria a enamorada.
            Feita a pesquisa inicial entre os elementos da Commedia Dell’arte com a estrutura e personagens da peça, cada integrante desenvolveu o seu trabalho dentro das características do tipo meia-máscara, pesquisando individual e coletivamente as cores que seriam usadas para a pintura e caracterização das máscaras, resultando nas paletas de cores preta, branca, vermelha, azul, amarela e verde-oliva, que servirão para formar as tonalidades específicas de cada máscara, que foram inspiradas nos seguintes personagens, animais e cores.
            Máscara: “Coruca” - Personagem: Lucas – Animal: coruja – Cores: verde-oliva, vermelho (duas tonalidades), preto e azul-marinho. Elaborado por: José Henrique de Medeiros.
            Máscara: “Ratazzo” - Personagem: Tabarim – Animal: camundongo – Cores: preto, chumbo e cinza – Elaborado por Alexandro Garcia da Silva.
            Máscara: “Rapozu” - Personagem: Tabarim – Animal: raposa – Cores: vermelho, laranja e amarelo. Elaborado por José Aparecido da Silva.
            Importante frisar que para a composição estética das máscaras além da pesquisa textual e estrutural da peça os participantes ao escolherem as cores e as referências animalescas embutiram na produção as proximidades comportamentais e psíquicas do imaginário popular entre os personagens e os animais. Para o personagem Tabarim o camundongo e a raposa representam o empírico, a esperteza e a agilidade, enquanto que para o personagem Lucas a coruja representa o racional, a sabedoria e a sagacidade, aspectos estes, ratificados pelas significações ocidentais das cores: cinza – humildade; vermelho – liderança, masculinidade, raiva; azul – conservadorismo, austeridade; verde – riqueza, ganância; amarelo – alegria, fraqueza, idealismo; laranja – energia, criatividade, sabedoria e preto – poder e mistério.

OBJETIVOS
Gerais:
Proporcionar o estudo da confecção de máscaras como elemento estético da produção teatral através da Commedia Dell’arte.

Específicos:
Confeccionar máscaras teatrais considerando as etapas da pesquisa e da produção;
Aprender técnicas de confecção de máscaras teatrais a partir de um molde positivo (máscara mortuária);
Participar do planejamento de uma exposição de máscaras de teatro;
Desenvolver a criatividade;
Aprender o manejo de materiais usados na confecção de máscaras e
Pesquisar tonalidades e produções de sentidos das cores.

PLANO DE EXECUÇÃO
            Após todos os processos iniciado pelo estudo da Commedia dell’Arte, passando pela produção do molde positivo (máscara mortuária), pela pesquisa do texto, das cores, desenhos e animais, pela moldagem, pelo empapelamento e, finalmente, pelo acabamento o resultado final será a existência de três máscaras teatrais dell’Arte inspiradas nos personagens da peça “Tabarim”.
            Incluída na fase de pós-produção os participantes desenvolverão uma exposição das máscaras, sob prévia autorização, num espaço e período determinados pela coordenação e administração do polo de Itapetininga/SP.
            Como os acabamentos das máscaras pelos projetos já definidos serão principalmente de cores quentes elas serão apoiadas ou fixadas sobre um fundo de cor clara, preferencialmente branca, para que se destaquem. Cada trabalho será identificado com o nome da máscara, o nome do personagem, o nome do animal inspirador, o principal material utilizado na confecção (no caso papel), o nome do aluno que a produziu e a data final da produção. Próximo às máscaras será fixado uma cópia do texto, um cartaz com o nome da exposição “Máscaras zoomórficas”, um breve relato e algumas fotos do processo de confecção, tendo por referência o seguinte esquema visual:
            Ressalta-se que o plano apresentado pode sofrer alterações quando da sua execução segundo as necessidades e condições estruturais do polo de ensino, local este sugerido para a exposição das máscaras.

CONCLUSÃO
            Considerando que o texto “Tabarim: o guarda de honra” apresenta situações farsescas de comicidade, de comportamentos individualistas e de personagens que procuram tirar vantagem e trapacear um ao outro, a escolha de encenação sob a estética dell’Arte só tende à valorização produtiva, uma vez que tal gênero possibilita uma maior expressividade corporal e rítmica.
            A confecção de máscaras configura-se como uma etapa de elevada relevância entre os diversos elementos e conceitos possíveis de investigação para esse espetáculo de linha cômica.
            Nisso verificamos que todo o processo, tanto o epistemológico quanto o pragmático, para as confecções das máscaras deu-se de forma sistêmica, no qual as inter-relações entre artista, personagem e máscara não se deram de maneiras isoladas, mas como integrantes de uma totalidade típica das produções cênicas teatrais, sendo a máscara um recurso cênico de caracterização fundamental para a estruturação e composição artística do espetáculo: o direcional e o atoral.
            E ao expormos o aspecto processual da confecção de máscaras proporcionamos experiências de aproximação entre a audiência e os artistas, que fogem tão somente das trocas espetaculares, abrindo para visitação e conhecimento um espaço íntimo, secreto e sagrado que permeia os profissionais envolvidos na produção de um espetáculo de teatro.        
                       


[i]   FO, Dario. Manual Mínimo do Ator. 2ª Edição. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 1999.
[ii] in VIEIRA, Marcílio de Souza. A estética da Commedia dell’Arte: contribuições para o ensino das artes cênicas. Natal, 2005.
[iii]  Disponível em http://escoladeteatrocatarse.wordpress.com Acesso 12/09/2010, 23h05
[iv]  Idem
[v] Disponível em  http://www.grupomoitara.com.br. Acesso 19/09/2010, 12h. Todas as informações sobre o processo e sobre as máscaras pesquisadas pelo grupo foram extraídas do referido site.